terça-feira, 9 de fevereiro de 2016

Recipiente e Conteúdo



Havia um sábio que em seus ensinamentos discorria diariamente a respeito de diversos aspectos da vida moral com muita profundidade. Seguidas vezes, os discípulos lhe perguntavam sobre a fonte da qual extraía seu estoque inexaurível de sabedoria. E o guru respondia-lhes que tudo estava escrito em um livro que herdariam depois que ele morresse.

No dia seguinte à sua morte, os discípulos encontraram o livro. Havia apenas uma página no livro e só uma frase: “Entendam a diferença entre o recipiente e o conteúdo, e a fonte da Sabedoria estará à sua disposição”.

O funcionário que cumpre suas metas pode escapar no meio da tarde para se divertir no cinema? Depende do que entendemos como metas. São números alcançados, resultados atingidos ou trata-se da consciência do dever cumprido? Ah, este campo é minado e dá pano para manga...

Na agitação diária e na obrigação de vencer a qualquer custo as empresas vivem numa ansiedade de resultados numéricos acima daqueles que trazem saúde emocional e paz de espírito. Tem algumas que ultrapassam os limites e vão além da ética para sobreviver, ou mais ainda, ganhar exacerbadamente.

Nesta confusão instalada sobre o que é ser um funcionário eficaz e cumpridor de seus deveres encontramos uma árdua tarefa de definir o que é legal e o que é ilegal. Tem muitas situações que são legais, mas não são morais. E outras ainda, não são leis, mas são morais.

O aumento de recursos financeiros disponíveis criados pelos vereadores para si mesmo é legal, pois virou lei, mas é imoral. Já liberar um colaborador no meio do expediente para cuidar de um parente de grau distante, mas que mora junto e depende dele não é liberado pelas leis trabalhistas, porém certamente de moral elevada.

Por outro lado, o número de colaboradores que se permitem perder tempo com excesso de distrações é imenso, nas mídias sociais, prática conhecida como "cyberslacking" ("cybervadiagem em português claro"), dizendo que vão visitar clientes, mas gazeteam o tempo. Perde-se tempo medido e mental, pois o sentimento de culpa instala-se trazendo transtornos imediatos.

Pesquisa com 10 mil executivos brasileiros apresenta números impressionantes. 5 horas a menos por semana em 30 anos são 2 anos a menos de trabalho, ou seja em torno de R$ 500 mil de prejuízos.

Será melhor fazer acordos para permitir vida após trabalho e trabalho com eficácia. Para as mulheres que tem jornadas quádruplas, profissão, esposa, mãe e dona de casa e ainda precisam estar bem arrumadas na segunda-feira cedo, como conciliar? Como ir ao salão no meio da algazarra dos filhotes “doidos” por um tempinho junto à mãe?

Deixemos de hipocrisia quando temos discurso progressista, dizendo ser liberais e no fundo queremos controlar os funcionários em uma camisa de força. Permita que eles sejam pontuais, persistentes, compromissados, mas cuide também de liberá-los para estarem presente de corpo e alma quando no trabalho, sem as preocupações de tantas situações pessoais por resolver.

Vamos buscar a diferença entre recipiente e o conteúdo, entre o tempo concentrado e o tempo disperso e assim, saberemos onde e quando chegaremos e qual é nosso verdadeiro objetivo existencial. Pense nisso, mas pense agora!


Texto do Saulo Gouveia

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